Educação de gênero: uma urgência no combate as violências contra as mulheres.
- Bruna Basevic
- 25 de jul.
- 3 min de leitura
Por: Ana Magnani

Mãe de quatro e avó de uma; Educadora-Pedagoga pela UNESP/FCLAr; Sonhadora em busca constante por outros mundos possíveis para a educação; Mestra-Pesquisadora em constante processo extensionista pela UNESP/FCLAR. Doutoranda em Educação pela UNESP/FCLAr
buscando conhecer os sonhos das crianças e como estes impactam sua permanência e
desenvolvimento escolar. Artista-arteira-brincante, Arte-educadora nos Saberes Populares com a Carroça de Mamulengos/A Casa Tombada. Aprendiz inveterada das crianças que compartilham seus saberes nos encontros programados e, nos outros tantos espontâneos, em diferentes espaços e contextos. Além disso, tenho escutado mulheres nos mais diferentes contextos buscando tecer com elas, redes de cuidado e proteção.
Mulheres eram educadas a nunca reclamar, a guardar para si, a não incomodar. Educadas a cuidar, a acolher, a desculpar. A cobrirem suas dores, esconderem o seu choro, desculparem-se por não serem perfeitas, a amar sem esperar nada em troca.
Assim, elas não sabiam o que fazer quando a dor era demais, quando o medo ameaçava sua paz, quando o acolhimento não existia mais.
Cada vez mais isoladas elas ficavam, sem ter quem pudesse as apoiar, quem pudesse lhes dar abrigo, ou até, num momento de ousadia, elas próprias poderiam se amar.
Eram educadas assim ou ainda são?
Outro dia escutei uma mulher me dizer: “acho que eu vou morrer sem poder contar isso pra ninguém”....
E entendi, não é passado, apesar de todas as nossas lutas, a nossa emancipação acontece devagar. Ainda hoje muitas mulheres sofrem sozinhas mesmo estando entre outras mulheres.
Pois o tempo anda apressado e nos faltam oportunidades – e quem sabe interesse – em sentar-nos com a outra para a escutar.
Escutar exige tempo e respeito, desejo e disposição, acolhimento e silêncio e como fazer isso em um mundo que nos obriga a sermos distintas e separadas, sempre em busca da próxima etapa, do próximo self, da próxima promessa de prazer e felicidade?
Em 2024, 196 mulheres sofreram estupros diários, 4 mulheres foram mortas em cada dia. E nem falamos das outras tantas violências que fazem parte do dia a dia de cada mulher. Insultos, assédios, desconsiderações, diminuições, vergonha, medo; violências física, moral, patrimonial, psicológica, e muito mais ....
E me atravessam as muitas falas que escuto: “ele tinha razão em ficar bravo”, “eu não tenho para onde ir”, “não tenho com quem falar sobre isso”, “eu não sabia que podia denunciar”, .....
Tantas falas e costumes que já deveriam ter deixado de existir, mas que persistem....
Eu continuo escutando as mulheres, desde as jovens até as mais experientes, dizerem sobre existência das mesmas violências, em diferentes territórios do Brasil, nas mais diversas culturas, e isso me diz sobre um país que continua a reproduzir um modelo de poder, ou seja, lógicas internas de funcionamento de seu poder que perduram para além do período do colonialismo: o racismo, as formas de xenofobia, as próprias organizações de gênero.
É isso mesmo que você ouviu. Esses modelos de violências contra as mulheres foram organizados a muito tempo, como processo da nossa colonização, e ainda hoje continuam a se reproduzir da mesma forma.
A professora e socióloga argentina Maria Lugones irá nos provocar a pensar a questão de gênero, a partir do entendimento de que existe uma colonialidade de gênero. Lugones irá compreender como as relações de gênero e sexualidade são impostas e significadas a partir do norte do mundo, desse modo, essas construções de gênero devem ser consideradas eurocêntricas.
Ser homem e mulher, na forma como ainda o compreendemos, é um ideal colonial moral, parte de um processo e de um projeto de civilização que continua a ser reproduzido.
A mulher continua a ser um corpo a ser conquistado, dominado e adestrado, para tornar-se submissa, obediente a esse mundo patriarcal-machista.
Poucas de nós, ainda hoje, conhecem os seus direitos, ele não nos é ensinado pela educação formal. Não temos educação de gênero; nem homens, nem mulheres discutem os seus papeis. Tudo está normatizado. E isso não é por acaso. É um projeto de manutenção de poder.
“É assim mesmo”, me dizem muitas mulheres, sejam elas das classes mais vulneráveis ou membros das classes abastadas.
Diante dos feminicídios e das diversas formas de violência praticadas contra as mulheres em nosso país, uma educação de gênero se torna urgente, para ensinar as crianças a refletirem sobre os direitos e deveres que temos enquanto cidadãos; a desconstruírem um imaginário machista de violência contra as mulheres transmitidos de geração em geração; e finalmente, para compreender que a mudança depende de todas e todos e que, cada um, tem um papel a cumprir nessa luta.
Muitas vidas, diariamente, são vítimas dessas práticas de poder que continuam operantes e não podemos mais continuar a aceitar resignadas. A mudança é imprescindível!