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Foto do escritorBruna Basevic

Tudo velho de novo

Por: Valéria Barros


Sabe aquela sensação que dá quando pegamos uma roupa antiga que já não cabe mais e insistimos em entrar nela?

Então, foi o que imaginei quando ao conversar com minha filha fui apresentada as tradwives, ou esposas tradicionais.


A primeira reação foi de indignação, como podem mulheres do século XXI se prestarem a esses papéis depois de tudo que nossas mães, avós (e puxa essa corda) viveram?

Depois do primeiro impacto, era chegada a hora de entender o ‘retrocesso’. Tudo bem, o mundo inteiro sabe que as mulheres acumularam funções ao irem para o mercado de trabalho (não acredito que ainda estamos falando sobre isso) já que muitos homens insistem em não absorver as tarefas de casa, familiares e escolares dos filhos, mas daí a se tornar uma esposa tradicional me pareceu demais. 

Fui tentar entender o assunto.


O movimento ‘tradwife’ se inspira no modelo de esposas nos Estados Unidos (EUA) entre as décadas de 50 e 60, mas o termo só começou a se popularizar cerca de 6 anos atrás com as ‘modernas esposas tradicionais’ nas redes sociais, especialmente no ‘Reddit’.

‘Reddit’ é uma plataforma onde se pode discutir, perguntar e compartilhar conteúdos de diferentes nichos. Esta plataforma tem um sistema que promove os conteúdos mais procurados e interessantes, uma forma de hierarquizar assuntos e assim, através do tópico antifeminista ‘Red Pill’ ou Pílula Vermelha o movimento tomou volume.

É dessa forma que a humanidade caminha, em uma espécie de pêndulo entre avanços e retrocessos e, é claro, para o feminismo não seria nada diferente. 


Quem são as esposas tradicionais na atualidade?

Em geral, são exatamente como as do passado, em outras palavras as mulheres antigas; são donas de casa, mas que defendem o estilo de vida baseado em cuidados com o lar exclusivamente, ou seja, cozinham, cuidam da casa, dos filhos e dos maridos, uma espécie de romantização de ideais machistas. Desta forma as esposas reforçam a estrutura patriarcal, já que o poder financeiro fica com os homens, colocando-as em lugar de submissão, pelo menos é isso que elas promovem, papéis de gênero muito bem marcados e normas sociais conservadoras garantidas.


O diferencial, talvez seja, que muitas destas mulheres já estavam no mercado de trabalho e abandonaram suas carreiras e profissões para se dedicarem exclusivamente ao trabalho doméstico e, algumas influenciadoras quando famosas, fazem dinheiro vendendo seu estilo de vida nas redes sociais. 


Vale dizer que essas influenciadoras são mulheres muito bem cuidadas que vinculam conteúdos sobre moda, beleza, atividades físicas e também sobre alimentação, decoração, essas coisas que promovem ‘um lar equilibrado’ na visão delas, afinal, tudo isso é atribuição das esposas que devem ser impecáveis nas suas mais diferentes funções.

Segundo o site da Forbes, as brasileiras dedicam até 25 horas por semana a afazeres domésticos e cuidados com crianças e idosos, enquanto os homens dedicam cerca de 11 horas, o mesmo não acontece em outros países com maior igualdade de gênero como Suécia e Noruega. A pesquisa ainda aponta que as mulheres teriam contribuído com US$ 10,9 trilhões para economia global em 2020 se recebessem, vejam bem, um salário mínimo pelas tarefas domésticas que realizam. Não dá para começar a pensar neste impacto e interesses econômicos envolvidos neste mercado?


É importante salientar que existe um risco na dependência financeira. A realidade é que o marido pode ficar doente ou desempregado e o casamento também pode terminar em divórcio. Neste caso, com ou sem filhos, a lei brasileira prevê 5 anos de pensão (que pode ser revista dependendo dos casos) para as esposas que abriram mão de seus trabalhos para dedicação exclusiva ao lar e muitas vezes elas já não conseguem se inserir ou retornar para o mercado de trabalho.


 O fato é que o lugar da mulher é onde ela quiser, isso já foi dito bem antes e deve ser respeitado. É claro que os casais devem pensar criticamente sobre o que é melhor para a família e acordos de toda ordem podem e devem ser feitos; os homens também podem ficar com a responsabilidade doméstica se assim decidirem, mas a realidade, especialmente brasileira, ainda está bem distante destes ideais.


Trocando em miúdos; os maridos não avançaram, as esposas retrocederam e terceirizaram, agora de forma espontânea, suas vidas.

O futuro nos mostrará se os ‘maridos tradicionais’ vestiram roupas contemporâneas.


Referências: 



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